quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Cena urbana n.4

Uma árvore que produz jacas. O homem apareceu no ponto de ônibus com uma longa cabeleira despenteada e amarrada por um laço, um papel com um endereço na mão e um sobretudo preto, chamando a atenção por estar um calor de trinta e seis graus, a sombra do sobretudo poupava os olhos de uma velha raquítica, além disso, ele também estava de óculos escuros e se melhor reparado, percebia-se um cabelo saindo de suas duas orelhas, cabelo este que era puxado para trás, por cima das mesmas e amarrado junto ao cabelo. Ele tinha aquele problema desde moleque, e já havia feito um tutorial escrito á mão: "Certifique-se de que suas mãos estejam limpas e livres de suor e gordura, então corte o excesso de pêlos do ouvido, limpe bem a parte interna das orelhas e remova a oleosidade utilizando um algodão umedecido em álcool." Lembrava que quanto mais fazia isso, mais grossos e fortes os pêlos cresciam. Mas já contava com quarenta e cinco anos e aquilo começava a virar um verdadeiro incômodo, principalmente na repartição que trabalhava. Decidiu então tentar a sorte num aclamado médico de nome Toonie Sheltie e carregava o endereço consigo, esperando o onibus "Brasilândia - Perus".
Ao entrar no ônibus pensou no trajeto porque nunca havia mostrado real interesse em ir atrás disso. Quem sabe não poderia deixar tais pêlos crescerem de vez? Soube de um indiano que bateu um record mundial com isso. E por mais que cortasse, em pouco mais de uma semana eles já estavam de volta, mais grossos, volumosos e reluzentes, transparecendo a luz tal um espelho de loja de antiguidades. Ao entrar no consultório, esperou pelo médico, que tinha um forte sotaque inglês e uma cara retorcida e avermelhada. O saudou simpático, como um gordo falastrão, e após um rápido exame, completou com um português que saia como se tivesse o parido um platelminto: "Pode ser causada por fungos no cônduto auditivo que acomete, ou mesmo uma seborréia. Pode ser causada, também, por fatores externos como umidade e calor. Mas duvido que seja uma hipertricose generalizada congênita." O formalismo do português do inglês potencializou ainda mais a sensação desconfortável que o paciente sentia. "Você não estaria, por acaso, com um calor? Com esse casaco deveras grande?" Respondeu um não taxativo e seco. "Tem cura?" "Precisamos saber exatamente o quê acomete. Tem sentido dores? Secreções?" Respondeu novamente um não, mas que secreções eram constantes. O médico perguntou a coloração delas. Ele disse que amarronzadas, claras. "Bem, amigo - sorriu o gordo simpático de jaleco - o tratamento e a gestão consiste na depilação, repetidos barbeares, métodos depilatórios, branqueamento e diatermia. Nada mais além disso podemos nós fazer".
O paciente foi embora extremamente aborrecido. As palavras formais e mal articuladas daquele inglês ressoavam em sua mente. Pareciam vibrar nos pêlos de sua orelha, um a um. "Especialista, o caralho" disse um pouco alterado dentro do ônibus. Uma jovem de vinte e poucos anos que estava de pé o olhou, mas não com ares de reeprendimento, mas de compaixão. Porém uma compaixão misturada com um certo nojo e repulsa. Aquilo a excitava de um modo nunca antes sentido. Ele começou a se sentir incomodado com o jeito que ela olhava. "Posso me sentar?" Aquela pergunta o pegou desprevenido, qual ele tentou abrir a boca de um jeito rídiculo, ela já havia se acomodado. "Me chamo Juliana e você?" "Carlos". Carlos sentiu uma necessidade imensa de esconder os pêlos da orelha, pensou que devia ter saído de boné, e mais, ao sair do consultório esqueceu de amarrar os fios junto ao cabelo, deixando longas mexas suadas e rebeldes despontando da orelha. Não se incomodava tanto com a anomalia desde que era garoto no colégio. Agora, ele ficava tentando virar o rosto, tentando de algum modo esconder aquilo. Juliana falava, falava, falava, ele tinha que responder, responda algo, rápido, o quê ela perguntou mesmo? "Sim." Foi isso. Saiu um sim. Um longo, articulado e sonoro sim, apenas. Seja o quê ela havia perguntado, tinha encaixado bem, pois ela sorriu satisfeita. Após um pequeno intervalo ela levou a mão direita até a orelha de Carlos, ele petrificou. Com os dedos indicador e polegar ela começou a enrolar os fios da orelha esquerda de Carlos. Bem devagar e carinhosamente. Ele virou lentamente os olhos para ela. O suor começava a cair. Fitando seu rosto, ele não conseguia definir aquela expressão. Era um expressão carregada de uma mãe que perde seu único filho, de uma criança excitada com a chegada dos primos, de uma pessoa que aliviava um pus sanguinolento numa vasilha após horas de agonia, de alguém que havia levado uma picada de marimbondo nos testículos. Um misto de tudo isso e algo mais. Carlos não conseguia mais falar nada, nem esboçar reações. A mulher acionou o botão para descer no próximo ponto. Puxou carlos pelos pêlos da orelha até sairem do veículo. Andaram duas quadras sem dizer nada. Carlos atropeçava a cada cinco minutos, e já não pensava mais na orelha e sim na ereção que teimava em não vir. Na casa de Juliana, ela o jogou na cama e retirou toda sua roupa, mas impediu Carlos de tirar a dele. Ficou então se esfregando nos pêlos de Carlos, freneticamente, e empurrava a cabeça com violência para experimentar também o outro lado. Carlos começou a gemer e ela teve um orgasmo escandaloso enquanto a orelha de carlos jorrava um líquido marrom claro, farto. Carlos levantou. Em pouco menos de 2,8 segundos ela começou a tremer na cama, em posição fetal, soltando grunhidos agonizantes e chorando baixinho. Começou a chorar mais quando ele se virou e disse: "Vou tomar um banho, amor, e volto logo".

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Cena urbana n.3

Uma árvore que produz jabuticabas. O senhor apareceu no ponto de ônibus trajando uma roupa de esportista de meia-idade, uma carta na mão esquerda, a sombra da carta repousava até a metade de seu shorts e haviam rugas inumeráveis em seu rosto. Olhou para a mulher que ouvia música com fones de ouvido, voltou-se novamente com o olhar para a rua e respirou forte. Parecia preocupado e mordia os lábios como que apreensivo. Não chamou muita atenção até que saiu caminhando em direção é rua. Ouviu-se buzinas, gritos e lamúrias. O velho embaixo do pneu traseiro de uma pick-up. O trânsito parou. Visivelmente ele ainda respirava. Alguns curiosos sairam do comércio, os carros que passavam devagar ao lado recheavam suas janelas de rostos perplexos, todos os presentes no ponto de ônibus vidravam seu pensamento para a carta do velho que continuava pressionada em sua mão, até que ele a afrouxou num "ai" apagado, primeira palavra que pronunciara. Só então se relaxou por completo e morreu. Seus olhos ficaram abertos, olhando diretamente para uma criança, uma menina que não esboçava reação alguma, apenas o olhava de volta seriamente. Uma mosca pousou em seu olho. Pela primeira vez ouviram sirenes se aproximando. A velocidade de resposta se dava pela localização central do ponto. A menina andou demoradamente até o velho, todos olharam sem repreensão. Pegou calmamente a carta caída ao chão. Voltou ao ponto e sentou, acomodando os joelhos. Tirou um lápis roxo de sua bolsa e começou a desenhar na parte de trás do envelope. Ficou desenhando até que um dos paramédicos veio tirar a carta de sua posse. A menina respondeu tentando morder a mão do profissional. Causou estranhamento, e dessa vez a investida para pegar o papel foi mais brusca. A menina gritava e chorava de ódio, mas devido ao tamanho do paramédico, a menina cedeu, ficando apenas a olhá-lo com uma profunda raiva, um ódio flamejante.
- Valdir, guarde junto ao corpo.
- Que menininha mais feia. - Disse valdir olhando a menina, de aproximadamente seis anos, que respondeu mostrando o dedo médio de mão fechada.
Já no IML, o velho despido, as roupas, relógio e carta despejadas num recipente imundo de plástico, os médicos e legistas conversavam sobre o fato do idoso não estar portando carteira, nem identificação. Esperariam um tempo até a família aparecer, dar por sua falta, ou então abririam a carta, coisa que julgavam anti-ético por se tratar claramente de uma carta de suicídio endereçada á uma pessoa específica. Os desenhos roxos indecifráveis atormentavam ainda mais os legistas, como que inconscientemente impediam sua abertura e davam um ar semi-cômico e assustador á cena geral. Um deles acabou por virar a carta no recipiente de modo que não se viam os desenhos. Os outros positivaram o feito com um silêncio. Passou-se uma semana. Decidiram abrir a carta. A curiosidade tomou conta de quase todos os legistas do IML. A sala parecia uma festa do pijama, todos vestido de branco. O cúmulo chegou-se a dar quando um dos médicos repousou um copo plástico de café sobre o peito do defunto, sendo alarmado pouco depois por um dos colegas. Quando pegaram os pertences, a carta havia sumido. Num outro ponto, alguns meses depois, uma velha aparentemente abalada esperava de pé um ônibus com uma carta na mão. Avançou para a rua e foi atropelada. Ao soltar a carta, ela tombou revelando desenhos roxos na parte de trás, soltando um único e apagado "ai".

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Cena urbana n.2

Uma árvore que produz maçãs. O homem apareceu no ponto de ônibus trajando um terno preto, uma maleta clássica na mão esquerda, a sombra da maleta descansava até a metade de suas pernas e seus cabelos eram grisalhos, quase prateados.Não fazia contato visual nenhum com quaisquer dos transeuntes ou das pessoas que esperavam a locomoção. Não parecia sorrir, embora levantasse um pouco os lábios superiores, como se palitasse os dentes com a língua e devido ao formato de seu rosto julgava se tratar de um oriental. Estava naquele ponto por cerca de meia hora, aquele sol de duas horas da tarde da maior cidade da américa do sul repousava generoso em sua cabeça, reluzia todos os fios e parecia incomodar todos ali, apenas via-se um rastro de suor escorrido de sua fronte que o homem não enxugou. Essa gota, após rolar demorosa, acelerou-se depois do queixo vindo a sumir na camisa branca do terno. O homem chamava a atenção. Vero fato. Chamou maior atenção em particular á um idoso que esperava um ônibus que costumava demorar. Tinha visto todos os ônibus pararem ali e somou o fato de que em nenhum deles era o do homem de terno, talvez esperasse o mesmo, quando um Jaguar cinza XKR S passou e parou perpendicularmente á maleta do homem. Ao abrir a porta, o velho notou mais quatro asiáticos vestidos da mesma forma. O carro parou em frente á uma casa amarelada e desgastada com a humidade, de trancas enferrujadas. Duas buzinadas. Cerca de um minuto e meio depois, esperados pacientemente com o carro ligado, um homem ocidental desceu. Ao abrir a porta, via-se as escadas para o andar superior. Entregou dois pacotes amarrados igualmente por uma fita vermelha e o símbolo do chujak, o pássaro que simboliza o sul. O carro seguiu para a parte mais baixa do Bom Retiro, parando no jardim da luz. Desceram dois homens, os outros dois continuaram no carro. Ficaram parados ali. Dentro do carro os dois trocaram duas palavras. Pararam num comércio coreano. A mulher gritava histericamente enquanto os homens se dirigiam ao fundo da loja. Os dois homens eram o da maleta e um que andava mancando e possuia uma bengala que fazia muito barulho a cada estocada dada no piso formado por tacos. Chegando os dois ao fundo da loja, num pequeno quarto, um velho coreano estava atrás de uma mesa com cara de espanto. Tentou tocar na gaveta, um dos homens jogou sua bengala que acertou a mão do velho em cheio. Ele gemeu. O homem sem bangala encostou as costas na porta para impedir que a mulher histérica conseguisse abri-la. O outro homem lançou os dois pacotes encima da mesa. O velho hesitou. O homem de terno então abriu a maleta e retirou uma pistola, cromada, da marca Captain, e apontou. O velho abriu o pacote. Dois dedos de mulher no primeiro, ambos os mindinhos. No outro pacote, uma foto de uma garota sendo estrupada por sete homens. O velho gritou: "Ttal!" e avançou no homem que respondeu apenas com um soco. O velho se contorceu com o golpe, virando no chão. Resmungou palavras que não agradaram os dois homens. Um foi até o vaso. O velho gritou de mãos levantadas. O jarro foi ao chão revelando grande quantia de dinheiro. O homem de pistola pressionou-a contra a testa do velho: - Annyonghi kaseyo, Geseki.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Cena urbana n.1

Uma árvore que produz pêssegos. A mulher apareceu no ponto de ônibus trajando uma roupa beje, quase apagada, a sombra de sua sobrinha descansava até metade de seu corpo. A menina tinha tinta em seus cabelos, tinta sem espaço para crescer com mais comodidade desde a raiz genoflexória. A tia propôs uma brincadeira para entreter a menina que não parava de falar. Ela tinha que pronunciar corretamente a palavra oftalmotorrinolaringologista. A cada tentativa, uma velha senhora sorria oferecendo balas de cacau e canela. Essas são muito ardidas, a tia dizia, e colocando as mãos de unhas pretas de sujeira retirava cada casca de canela que envolvia as balas e então oferecia para a menina. As cascas eram engolidas de uma vez pela tia e o sol era de duas horas da tarde. Ambas iam para o limão, visitar o exmarido, antigo tio. a velha dizia ter agrafobia, mas o dizia entre dentes, pois a excitação era visível em seus olhos mareados. quem era ela para ter fobias? A tia citou as fobias de seu nome: Claudete. Essa sim eram fobias, e jurava ter todas: Cacorrafiofobia, Caetofobia, Cainofobia, Catagelofobia, Catapedafobia, Catoptrofobia, Cenofobia, Cimofobia, Cinetofobia, Cipridofobia, Coniofobia, Cosmicofobia, Crometofobia ou crematofobia e por aí ia. A velha planteou o rosto dois centímetros acima dos olhos da tia. Calor infernal até o fim do dia. O ônibus "Vila Nova cachoeirinha - Avenida Celestino Bourroul" parou. A sobrinha se negava a subir até recitar corretamente a palavra. Nada que dois petelecos na orelha de mão fechada não resolvesse. Não havia assento, Claudete concluiu: Não há lugar para a neutralidade. Neutro em opressão se apóia algo injusto. A senhora tinha manias de esclarecer tudo para a menina, batendo-a quando não concordasse ou não fingisse atenção. Ao chegar até a avenida, desceram e seguiram a pé. Era perto dali. A tia acendeu um cigarro catingudo, respirou forte, apertou as mãos da menina sem querer. Esta tapava as narinas com cara de nojo a cada baforada, a tia não via, ou não demonstrava abalo, sua visão estava fixa no prédio á sua frente. Não terminou o cigarro. Jogou quase inteiro no chão e pisou, entrou no prédio. Com quem? Roberto. Quinto. Ok. Entrou no elevador. "Sua filha." e entregou para o ex-marido. "A mãe disse para não ficar bebendo na frente dela" e ia saindo. "Claudete?" Roberto falou. Ela virou lentamente, "Diga á sua irmã que sinto muito".

sábado, 3 de outubro de 2009

Como entonar una canción

Emposte la voz quadrifônica al modo de Pergolesi y sonría como si mañana no hubiera, haciendo picos como un frânces pequeño y rude a comer queso muerto con la compañía de gatos mulatos sin pensar el día de mañana y haga una pose de emperador magistrado y reconocido por el interior de su país. Repita la operación.Observación: No estoy seguro de si el proceso lleva más de cuarenta minutos, pero hay que aprender con la suficiente fuerza. Pero mierda, maldito diccionario, es que yo juegue trucos, suficiente en el contexto, pero son juegos tontos de los adolescentes nacidos de la prueba.

sábado, 8 de agosto de 2009

Ainda acho que os anos nos remetem ao número 27

Cada vez que eu podia passar um tempo, que podia passar por aquela praça daquela cidade vizinha, sobretudo á noite, percebia que sou o mesmo durante o dia, comum e corriqueiro. Não falo de alterados estados, de romantismo barato ou de nada. Quero a escrita consciente, o fato verídico de face moldada. Frio dia de ida. É evidente que quando me ponho á caminhar o que se sente é esse estado ambulatório, passos, falo de que em um determinado momento deixamos de participar desse mundo primário do que nos diz respeito á cidade. Os signos do descobrimento aleatório. As categorias lógicas de que o tempo muda. As pessoas recorrem á lugares inquietantes, galerias cobertas, igrejas sem silêncio. E que Cortazar foi um homem necessário para a humanidade. Queria poder afirmar melhor essas tais impressões. Mas tentativas não deixam de sê-las por somente elas. E por que não a barba e o cabelo te perguntam. E porque não a barba e o cabelo? Tente responder tal pergunta complexa. De não adianto. Óculos de armação laranjada e transparente em lentes enormes. Barbas no calor. As mãos em calo de caneta. Não sei estar sendo suficientemente claro. A devida carne branca se impondo aos milhares que compassivos a olha distante para nossos olhos suficientemente redondos. Olhos redondos. Os olhos das letras e das artes que nos interessa. Temos várias linguagens para vender, jovem escrivão. Grato, fico com essa. É-me mais entinta. Íntima. Amostras? Deixe ali encima da mesa, já olho, estou ocupado aqui não querendo ser estético. Não vejo espuma na sua bebida, ela escorre pelo canto da boca semi-aberta. Um livro violentamente doce golpeia minhas narinas. Ainda não lembro o nome da autora, é russa, disso me lembro, e é um livro comunista. Tem cheiro de rosas com urina. Urina feminina na face do homem, sem barba, entende, não entende, não sei mais o quê digo, chacoalhando a cabeça para afastar jogos de armar infantis. Já fomos advertidos milhares de vezes sobre o imperialismo norte-americano e a vergonha nos fez deixá-lo sucumbir aos poucos, como é de sua natureza constatada. Como quem leva uma bofetada na face e nada faz. Espera a vingança com o passar dos dias, em alerta sobre novas. Corte meu azar. Não há nada que você possa fazer com sua força, pois acho que os anos nos remetem ao número vinte e sete e não há nada que possamos fazer sobre isso sobre nada podemos. Todos querem a chave do carro caro, meu caro. Sempre o caro. O começo da estrada, a estrada começa num circo logo encima de sua cabeça, nossa descendência portuguesa não nega. E se nossas letras fossem desenhos. E desenhos fossem letras nossas. E que tais desenhos combinados gerassem histórias. Histórias de olhos redondos e de carne passada. Branca e fosca. Veias negras ou azuladas. Mais abaixo tem um coração, deixe-lhe comprar um pé de porco com cerveja quente, faço questão ele me disse. Conversamos sobre Cortazar novamente, não consigo falar de outra coisa no momento, me desculpe. Seu perfume impregna as paredes de minha consciência como uma fábula contada pela metade. Uma montanha negra de provérbios, descidos pela garganta empurrada com dialéticas baratas. Minhas baratas dialéticas. Por que tem um sino batendo, por que tem um homem correndo com sangue na camisa. Por que há campeões esbarrando em borracha, porque há metais pesados correndo em nossos pulmões. O dia de hoje não passará por essa porta, pode tentar joga-lo quantas vezes quiser. Deixo-a ir e ela volta. Seguro e ela se vai. Eu não acredito mais no quê digo, eu não sei se os convites devem chegar por carta ou telefone ou por sons de vidro da rua, a mesma rua que não me convida mais como antes. Tem som no lugar que estou, estou sozinho, estou acompanhado de milhares de gerações á minhas costas. Quem pode ser nesse dia de hoje senão nossos próprios pais afastados de diferentes tipos de escória. Nós somos as escórias. Nós somos o não ligar de ser congelado pela história. Congelado pelos atos que passam. Passam. Olho minhas mãos, seguro uma na outra, esfrego, sinto o cheiro de carne e sangue ditador, de raça maldita, sanguinária na preferência de balas, na preferência de mortes por empalamento. Não culpemos os assírios. Usamos mais. Onde uma rata se enobrece, tem bandeiras sobre-humanas e cantam hinos e alguém o prende, seu grande filho de uma puta, com uma medalha no peito. Uma região de mãos sujas, pincéis nos cabelos, meninos de dentes podres e boca arreganhada.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Prisioneiro de Guerra

Havia mais de oito antagonismos em suas cartas, ele tinha uma roupinha ridícula de marinheiro, estava deitado na mesa com um copo de vinho ordinário que movimentava tal um brinde escuso para espantar as moscas que pousavam de cócoras botando ovos em seus cabelos. Alguém se aproximou. Conheço você, eu conheço você. Qual a diferença? Diga um óla e um adeus olhando nos olhos. Seus olhos estavam tortos, descarregara toda a urina nas coxas, escorrendo até o sapato; Gritos. Levantou, equilibrou. Eu conheço você, você me conhece. O ambiente parecia ter sido tirado de uma animação de Alexander Petrov. Sentaram para tirar satisfações. Fui acordado dessas memórias por um murro na beliche. Éramos despertos sempre ás cinco para recebermos a nossa quantia diária de pão, seco, murcho, enbostiado e colorido de fungos, mas pão; As prisões da Tchecoslováquia na década de 40 para estrangeiros eram menos que cinzentas, eu era (sou?) português de Caldas da Rainha, de Leiria, cidade recente porém decente. Dê-me um beijo, que diferença faz isso, apenas me dê, nunca mais a vi. Fui receptado em minha casa. Trabalhava de funileiro na rua principal, auxiliar diria. Outra batida no beliche, vários, somavam mais de vinte. Banho geral gelado, cuidado, não podemos atropeçar por nada desse mundo. Poderíamos ser animais, eu seria um peixe, o theco um gato, o frânces prisioneiro um sapo. Gertrô, meu amigo. Roubava cigarros para trocar por comida clandestinamente. Os antagonismos de que falo são de cartas da minha mulher, tão gorda de carnes que acordo transando com a cama, ás vezes com o travesseiro e ás vezes com o membro ereto nas mãos, sem flexioná-lo, sem me masturbar, nada, apenas com ele nas mãos e os companheiros olhando com ar de reprovação, indignados. Estamos presos e não há diferenças de cores e nações. Um por semana é executado da seguinte forma: são escolhidos num jogo funesto, um jogo onde somos postos em fila da qualsete são escolhidos, geralmente os mais magros e fracos, pois não podem trabalhar, sendo obrigados a virar uma garrafa cada um, depois outra, depois outra, até o primeiro desmaiar e em consequência levar um tiro em cada perna, ainda no chão e depois uma bala firme na cabeça. Já vi casos de pessoas tão embriagadas que nem gritavam com o tiro nas pernas. Isso irritava os oficiais, que faziam questão de perfurar o corpo como um queijo suíço antes da bala fatal. Fui escolhido duas vezes, estivera doente por um período e escapei com vida, felizmente. Haviam apresentações vez ou outra de grupos circenses, escolhidos á regalia do comandante geral, coisas horríveis que eramos obrigados a ver. Havia uma sala de execução que ficava no meio do caminho do banheiro, aonde os porcalhões não recolhiam os cadáveres dos executados e ás vezes tinhamos que pisar naquela carne mole, com medo de escorregar e com os pensamentos voltados no fato que um dia poderia ser eu ali, sendo pisoteado também. Jogávamos carta vez ou outra, mas tínhamos que descartá-las nas nossas bocas quando um oficial passava. Vestia grinalda, era conhecido como Mafalda. Chamava um dos presos para ir em sua sala, quando retornava parecia abatido, mais triste. Nunca perguntávamos o quê ele ia fazer lá. Hoje tenho nacionalidade romena, álibe de refugiado, rugas no rabo. Ainda bem que aquela merda foi dividida em dois países, ainda penso enquanto reflito na latrina.

terça-feira, 28 de julho de 2009

O Abilolado (Pequeno momento cênico)

Peça para ser apresentada durante o intervalo de uma apresentação cênica, sem aviso prévio que a mesma ocorrerá.

Damásio (personagem principal)
Hermínia (Puta)
Rav (O detetive)
Zenaang ( O leme)
Ed ( O herói)

Cena única
Rav - Precisamos descobrir.
Damásio - Já descobrimos.
Rav - Como dito tá aí. Ela castiga as entranhas, anhas, anhas.
Damásio - Vejo-lhe puta.
Hermínia - Olá, oi, me aparto. És lícito saberes do meu parto?
Zeenang - Sabemos.
Damásio - Saibamos... Foi de aparecer costelando ecunbrências.
Rav - Não quero rimas.
Damásio - Não ás terá. A puta que vos falo sadeifica.
Hermínia - Não sei se é lícito por o nome de Sábado.
Zeenang - Talvez.
Rav - Bom dia é bom nome.
Zeenang - Não é breve. Moto passou aqui e desejou vidro.
Rav - Não quero saber de rimas.
Zeenang - Vidro tenho.
Damásio - Envoque o nazareno.
Zeenang- Bati a cabeça.
Damásio - Sangrou? Esbareijo, por quê nos proíbem.
Hermínia - Conselhos. Castiga as entranhas, anhas, anhas. Me passou rápido.
Damásio - Sei como é.
Zeenang - Façamos não sei como. Não dá pra imaginar se servirá.
Ed- Eu vim como o outro e da minha pessoa confiarás.
Damásio - Quem és tu?
Ed - ED, O JUSTO.
Hermínia - Hoje lambisquei os seis de fadonha.
Ed - a rima é fraca, os olhos puros. Vá para o lado
Zeenang - Eba (vai para o lado)
Damásio - Oba (vai para o lado)
Rav - Leve ele, breve.
Ed- consertado ficou, consertado está. Adeus.
Damádio - E o quintal?
Ed- Chame um carpinteiro e lave-se de imediato.

FIM

domingo, 19 de julho de 2009

Postagem 111

Na técnica e discordância é preciso mais do que a espera. A palavra não seria bem depressivo. Seria não saber a palavra. Mais forte que a palavra é o que vem junto dela. Mais forte que a palavra é o que vem junto dela, é o que vem dela. Mais forte que a palavra é o que junto vem dela. O que vem junto dela.Agora me encontraria? Não, o correto é agora me encontrarei e talvez saindo dessa palavra encontre a serenidade. Forçar a minha própria forca. Fechei alguns silêncios, cliques e diminuições para me encontrar como sempre: a passos rápidos. Tome um riso na cara. de faca. Se for internada, voltaremos somente á noite.A composição se desenvolve na redundância, pois quebrei o assoalho do chão com um taco de golfe em dois fragmentos. Um grande. Outro dois terços. Quantas coisas feitas em cor de banana. Fui embora levando estalos na orelha e ainda era por outro motivo. Seu cabelo era crespo e roupas conhecidas pelo esteriótipo. Parecia que ia oferecer artesanato hippie, mas só tinha uma mala. Ofereceu um gibi. Contei apenas oito árvores. Todas diferentes. Qual foi a melhor trepada de sua vida? Meio quilo de carne moída, seis claras de ovos em um vaso de gargalo fino. Contei apenas oito árvores e já havia andado oitenta e seis quilômetros.Um homem corre com sangue na camisa. na camisa um homem corre em sangue. o homem corre na camisa. o homem corre. há sangue na camisa. há sangue no homem. que corre. A carta de um morto vista antes de saber que estava realmente morto, antes de saber que vivia para um dia estar morto, era escrita pensando no enforcamento. Seria doloroso? Existem pessoas que arranham o pescoço desistindo de última hora. Escrevia para depois se matar e nunca mais parou de escrever. é mais um dia comum sem o café no açucar concorrendo á informações. conhecendo os códigos do dia. Brasas sujam a sala porcamente e me viro mais para a esquerda em direção ao feixo de luz que deve, pode, (não sei), vir do sol. É mais um dia comum. E se nos bastasse, já vai o tempo em que a gente podia ser comum. Herbácias no meio do dia, cara e âmagos e seu ventre que beijo e idolatro cego e infantil fedendo a cigarro fedendo a escarro a campainha o cachorro o carro meu chinelo a vassoura encostada na pia ao abrigo de aracnídios. é mais um dia comum. E se não bastasse, já vai o tempo em que a gente podia ser comum. O espaço bonito flagelou o homem simples que estava de terno terno. Vou jogar uma bomba nessa bateria que não é poesia, não é alegria, não tenho tanta alergia vadia maria. Coças a barba, nariguda? Sabes que não sou portuga e não me escondo. Bateste no meu cacete com tão demasiada força que sucumbi. Me apertaste tanto o caraco que sorri de velho. Pega no balango. Finge que é lango-lango. Ontem mesmo eu tentei tanto te procurar, mas outro ser te empetecia. Olhos seus olhos; me olhe o olho lúgubre, luz, lanterna, se valha a navalha lhama. Se Dharma chama reclama o olho-lago que a espera é longa que o ato é falho. Quisesse você ser uma espátula e suas lentes corretivas fossem ovos, eu choraria. eu chororovos.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

A surpresa da realidade

Estava pensando sobre uma declaração que li sobre um escritor que dizia ter-se salvo por parar de escrever "literatura" e passar a narrar fatos da realidade com frases simples, diretas e objetivas. Casos que contavam seu amigos ou fatos que o próprio tinha vivido. Os conceitos e idéias substituídos pela vitalidade. A salvação através da tentativa do espelho. O romance é na verdade sensorial em essência. Pensando em escrever ensaios por capricho, comecei essas palavras podres pensando que tal tema poderia ser um estudo sobre esse gênero para que eu possa começar a trabalhar nele. Acabo de ver algo na televisão: A pessoa tem três filmes, oito livros editados e cinco séries de Tv escrita por ela. Sinal de sucesso comercial? Me desculpe a merda cabeçal, mas ninguém pode escrever nada de bom tendo sucesso em vida, por enquanto não vi exceções a não ser algumas raras em termos de romance, aliás, as coisas realmente boas estão ainda nas gavetas, coisas de avôs, destruídas, mortas, nas mãos erradas, mal escritas caligraficamente ou então, atualmente, deletadas. A vergonha é o sinal de que a coisa está pura e bonita. Falando em bonita, há uma concepção em cada um de nós, talvez a minha mais próxima seja a de Baudelaire, francesinho, que é ela ter imortalidade e ao mesmo tempo característica mortal, deve ser histórica em termos de geração, porém sem a concepção de perfeição geométrica, que tanto defendem os que tentam universalizar a beleza. A beleza não é geométrica, ela é irregular. A maior prova disso é que algo realmente belo é circunstancial. A imortalidade de um segundo. A transformação da massa em termos pessoais, moldadas com o tempo daquele mesmo momento. Pro diabo com os formalistas russos.Impossível saber também a linha de pensamento de cada leitor de um texto. O resultado de tudo é a soma dos fatores intrínsecos ao texto com a capacidade imaginativa do leitor. As variantes são quase infinitas. E a projeção do leitor preenche os vazios do texto. Por isso tantos finais sem conclusão no realismo fizeram-se notáveis.As hipóteses levantadas pelo autor são como opções de uma prova vestibular, a grosso modo (desculpe a tosca comparação, mas serve), aonde não há respostas certas, porém a questão pode estar fechada (a,b,c,d,etc) ou aberta (escrita livre), esse último resultado extremamente complexo na obtenção, deixando apenas seu porte para os vulgos grandes escritores. Meu mestre, Sandro, dizia sempre um negócio que me impregnou de um modo que luto até hoje pra me ver longe disso: Grandes escritores escrevem frases de mais de uma página e meia. Não é bem verdade, vejo hoje, mas ele também dizia, assim como Ubaldo Ribeiro, que livros bons são livros que param em pé. Era um tarado esse meu professor, isso sim. Babava letras pela cueca. Tenho pensado muito em manias para escrever e estou procurando uma atualmente, rio muito com elas, as que já existem e que tem dono, na verdade acho todas românticas demais, pensei em várias, igualmente bregas. Estou pensando em pagar prostitutas para escrever sobre seus corpos, sobre folhas amassadas. Não tocá-las nem nada. Apenas escrever. Imagino as reações e consequências. De qualquer modo, ao final, talvez eu obtenha um livro caro e de bom cheiro, escrito inteiro sobre o corpo de uma mulher deitada, nua e triste.

terça-feira, 14 de julho de 2009

Márcia

Márcia tinha cabelos lisos, pretos, na altura dos ombros e escorridos como óleo frio que rudavam nos dedos quando eu tentava fazer um carinho no couro. O couro do sofá que estávamos deitados parecia absorver todo o nosso suor de poucos pudores e de farta preguiça. O sol batia tão quente na janela do meio datarde que tentávamos procurar um lugar em comum no sofá que não atesse o sol generoso. Isso nos deixava mais próximos. Seu pai era frânces, sua mãe indonesa, e haviam tantas gerações em suas costas que tantas histórias não se igualariam ás histórias refletidas em seus olhos. Ela nunca me respondeu, permanecia calada, passiva e precisa nos gestos quando se levantava do sofá para negociar um café com um dos índividuos que morava comigo na cozinha, voltava rindo de seu moicano. A liberdade da tribo que falava francês e lutava como ninguém. Discursava então sobre como os índios do norte tanto lutaram e os do sul sempre foram cabisbaixos aos caprichos espanhóis e portugueses. Márcia tinha uma verruga no canto da boca, do lado esquerdo, com alguns pêlos. Enquanto eu quase pegava no sono observava ela cuspindo, ou melhor, passando baba nos dedos para enrolar os três fios de pêlo que despontavam dessa verruga. Parecia pensar sobre o passado, ou sobre previsões do futuro. Já tinhamos conversado que não havia futuro para ambos, que estávamos naqueles viveres por pura gozação momentânia e acho que aquilo no fundo aborrecia a ambos. O fato de sabermos que não demoraria muito não ficaríamos mais juntos. Quando ela se colocava de pé a minha vontade era de cair de joelhos e tentar entender porque o fato de estar tão preso á ela me feria tanto. Também sempre a dizia que eu tinha sorte e muita afeição com nomes terminados com uma consoante seguida da vogal a, e que nunca me dava bem com pessoas cujo nome terminavam com uma consoante isolada, porém essa era uma regra com mulheres. Ela sorria e dizia que no caso dela eram duas vogais no final, eu cerrava os lábios a fim de ser compreendido. Seria ela uma exceção? Não, ambos sabíamos que nossa história não tinha relevância e isso nos maltratava. Gostava dela, e ela gostava de mim, nunca dissemos nada disso para o outro, as pequenas cochiladas á tarde bastavam e dentro dessa certeza de uma pseudo-relação sem futuro, e que essa sina não poderia ser mudada continuávamos até o dia em que ambos nos saturaríamos e esse dia nunca chegava. Recordo-me de que ás vezes eu a olhava fazendo compras e a julgava muito feia, um corpo pequeno, meio gordo, um jeito de criança. Engraçado os diferentes olhares que damos á alguém intimo quando sozinhos, olhando a pessoa de longe. Imaginando estarmos com essa pessoa. Costumava flagrar, sem que a mesma percebesse, quando me olhava também desse modo particular e cíclico em meus momentos de ociosidade, sempre generosos, em frente ao computador. A julgava feia nesses meus momentos de análise, porém nos momentos em que ela estava deitada, á meia luz, enquanto eu passava meus dedos em seus cabelos ensebados, olhando-a nos olhos, julgava se tratar de uma das belezas mais notáveis desse mundo. Márcia, aonde anda, aonde bebe, com quem janta nesse exato momento? Vai pra ti uma partícula do meu pensamento, o estalo do isqueiro no meu cigarro, um clarão de pequena saudade fingida, essas palavras despojadas de interesses.

terça-feira, 16 de junho de 2009

A crua Dádiva

Essa mesa está meio solta. Talvez tenha que parafusar melhor. A cadeira está meio capenga. Ou não quer suportar peso - não sei se ando gordo; devido á esta nova condição - ou são as ripas desgastadas? Da velha madeira que constitui. O papel está bem aqui. Na minha frente agora perturbável. Titilando a coloração sobre nariz. Caneta carregada de tinta preta. Vontade menos dispersa que antes. A preguiça descorroída, então discursemos... As informações que eu tenho: me ultrapassam á memória vaga. Para dois longos anos atrás. Eu andava pela rua baixa. O barulho da minha blusa. Ela chacoalhava em sutil sintonia. Com o mesmo chacoalhar feito: caixa de fósforos no bolso. Sonora enquanto um frio percorria. Os espaços de som ausente. Carne da blusa não tocava: a minha mesma longa carne. Tinha combinado encontrar uma amiga. No centro daquela pequena cidade. Caminhava lento com fronte renegada. Um carro parou perguntando direções. Expliquei sobre a procurada rua. Estava quatro quadras dele certamente. Perguntou-me mais algumas vezes mais. Dizia ser de uma cidade longínqua. Cento e quarenta quilômetros dali. Expus as quatro quadras novamente. Quando ele me interrompeu perguntando: se eu não poderia acompanhá-lo. Entrar no carro e levá-lo. Até lá, a rua pretendida. Sorri e disse que não. Firmou o argumento dizendo que: depois me levaria ao lugar. O lugar que eu iria. Assim que mostrasse a rua. Mostrei pressa, disse que não. Afirmei o lugar da rua. E me pus a caminhar. Menos de duas quadras depois (ao atravessar a rua velozmente) vi o mesmo carro contornando. Parou em minha frente brecando. Então sorrindo largo me disse: passei do lugar, não é? Nada respondi, atravessei a rua. O carro não veio mais. Respirei aliviado, livre de esquisitices. Cheguei na casa da amiga. Vi o movimento na entrada. Havia quatro pessoas, em círculo. Todos de dezessete anos cada. Ou não passando muito disso. Fumavam cigarros filtro vermelho. Baratos e os conhecia pouco. De vista eu diria melhor. Saudamo-nos e despontou minha amiga. Ficou na porta me olhando. Cumprimentou com um gesto cortês. De um quadro de Matisse. Ainda não acabado, realista então. Sabia de quem eu perguntaria. Disse sobre quem eu procurava hoje. Que estava escondida ali atrás. Na direção de um carro. Duvidei da veracidade do fato. Olhamos por uns dois minutos. Olhamos em direção ao carro. Mostrava nenhum movimento ou barulho. Achei ser brincadeira da outra. Uma menina, prima de minha amiga: foi até lá investigar, abelhenta. Ela saiu sorrindo do carro. Caçoamos da infantilidade sendo rudes. Entramos em seu quarto aromatizado. Quem esperei, ela, seu irmão. Seu quarto era todo escrito. Á caneta hidrográfica na parede. Gizes de cera e canetinhas. Recados, máximas e desenhos diversos. Desligou o computador com raiva. Disse ir tomar um banho. Precipitamos-nos até a praça central. Havia uma na pequena cidade. Conversamos um pouco, fumamos cigarro. Tenho crises de querer ir embora. Fui com sede de cerveja. Com o mesmo andar apressado. Chacoalho dos fósforos e blusa. Estava decidido a comer lanche. Tinha fome e nenhuma esperança. Pra minha surpresa encontrei lanchonetes. Duvidava estarem abertas no bairro. A praça estava vazia, feriado. Os bares fechados esperando amanhã. Mas esse bairro era rico. Tinha mais de quatro possibilidades. Na primeira já encontrei conhecidos. Fique muito feliz, havia amigos. Um que também escrevia frequentemente. Estava nesse ofício no guardanapo. Terminou com a boca suja. Suja de tomate do lanche. Mostrou com uma vontade morna: “Primeiro você se torna forte/ a mãe fumaça consome seca/ eu nunca lembro de números/e de umas boas piadas. Eu conheço um jeito narrativo/ de nadar até a cidade/ tem monte de gente nadando/ primeiro mova sua cabeça leve/ é fácil pra você né?/ se você tiver mãos, braços/ é fácil pra você querida,/ por que não tentar agora? Eu vou até o jardim/ tem vários feijões no chão/ doce, como os caminhos são/ quando vai pela primeira vez.” Elogiei, me deu o guardanapo. Por isso agora escrevo certo. Tenho certeza, a memória falharia. Pedi um copo, nova cerveja. Duas pessoas eu não conhecia. Éramos seis na mesa contando. Apresentaram-se ou me apresentaram, acho. Não me lembro muito bem. Um deles parecia muito bêbado. Puxou assunto á qualquer modo. Dizia ter um dom válido. Via cicatrizes, cicatrizes nas pessoas. Apontou pessoas diversas ao léu. Disse sobre o mais ferido: era um sujeito ali perto. Explicou a aparência da cicatriz: vinha do fim do pescoço. Até perto do umbigo, quase. Fazia uma grande curva riscada. Ela ainda sangrava muito bem. E tingia toda a camisa. Quando se levantava para ir, sair - até o banheiro, normalmente seria - sangue pingava de suas mãos. Deixando gotas no seu caminhar. As marcas dos sapatos tingidas. Tingidas de sangue no chão. A cada passo dado novamente. Ferida acabrunhada de cinco meses. Muito cutucada como ele notara. Havia sido ferido bem gravemente. Que tornava quase impossível estancamento. Ainda mais em prazo curto. Chutou dois anos e meio. Apontou dessa vez uma mulher. Na base dos cinqüenta anos. Uma cicatriz no seu ombro. Meio cinza e bem fechada. Disse sobre cada parte do corpo: Era responsável por um sentimento. “Humano”, ele me disse claramente. Quis saber melhor eu acho. Disse-me que eu não entenderia. Passou a descrever outras cicatrizes. Fechadas ou não sem diferença. Seus olhos fulguravam-se conforme falava. Passava a rodar as órbitas. Tinha sentido em suas considerações. Via como lhe saltavam feitos. Com a maior naturalidade desapercebida. Puxou um cigarro do maço. Olhou-me como quem analisa curioso. Torceu as narinas fungando-as rapidamente. Digo forçado esse pequeno sorriso. Colocou na barbicha os dedos. O polegar e o indicador juntos. Numa forma de V torto. Perguntei o quê via agora. Disse-me que não julgava ético. Pare de ababolhações, meu amigo. Tal chamativa não tirou propósito. Agora a figura não falava. Calou e conversava com outro. Tentei esquecer o assunto, certamente. Ficamos mais duas horas bebendo. Resolvemos ir para outro bar. Os diálogos se rubricaram cursando. Entendi tratar-se egoísmo a pergunta. Sua recusa valia seu dom. Não sabia como cercá-lo ligeiramente. Para minha surpresa infeliz, vi. Vi o carro do perguntador extravagante. Passava célere como quem ronda. Cutuquei o visionário de espírito. Fi-lo analisar o cara baitola. Mesmo passando rapidamente, ele enxergou. Tinha uma ferida na boca. Disse ainda quem ele era. Um dos que ele nomeava. Um “ferida rosa morna”, disse. Que buscava a ferida própria. Rimos e discursamos avenida abaixo. A situação engraçada nos aproximou. Vimos o nome em letreiro - era um estabelecimento novo dali - contamos o dinheiro e entramos. Não falamos sobre velho assunto. Durante a meia hora quase. Engolimos mais umas duas cervejas.Cada um fez um brinde. Um conhaque pediram sem hesitar (na última hora que podiam: o bar fecharia em breve). Pensei na mulher que deixara. "É assim que ela começa, amigo. Vejo em todas as pessoas: a capacidade de querer sangrar - de seu cutucar para isso. Parece-me que adoram a dor. Que a cura é evitada.Para isso temos remédios vários. Tempo, nova dor e loucura. A última me agrada mais." Agora bêbado parecia mais interessante - tentei colocá-lo para falar mais. Eu acreditava naquele sujeito, sim. Veio correndo um novo ser. Chegou até nós com armas. Duas facas grandes de cozinha. Enterrou-as no peito do médium. Ele gritou, abriu duas vaginas. Duas gigantescas vaginas profundas, curvadas. Gritou "Como minha minha ferida". Saiu correndo pra rua abaixo. O médium frio caiu ensanguentado. Tocou meu ombro e sorriu. Vi várias escoriações na cara. Não lembrava de atingí-lo ali. Vi outras, bem mais fundas. Nas pernas, nos dedos, enfim. Morreu sorrindo, despreocupado, sereno. Não vi mais suas feridas. Hoje sou outro, logo percebo - basta ver a minha maldição. Passada como carne mal passada. Crua, sêca, fria e aberta. Não sei passar, já tentei. Precisaria tocar ao morrer, será? Não me basto de perguntas. Parece-me que além de ver... ainda tomo dores emprestadas, veja. Chega de contos de cinco. Chega de debasafar capitães dirigindo. A soma de tudo basta.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

Agouro

Sábado à noite é necessário pagar. No final do dia, que é também um fim de semana, se sente como se chegasse no domingo. Ao longo de todo o bairro, são gritos, chamadas, surtos nas portas dos cabarés. Entre esta multidão de trabalhadores de fora da calçada que segue a alta e íngreme estrada, uma pequena sombra furtivamente apressa seus passos até os moinhos e grandes pátios se enchem de silenciosos ruídos e movimentos. A janela onde estava sentado se prepara para colocar a sua cobertura. O homem subindo para o almoço. Ele estava muito perto nessas grandes oficinas de vidro que pode até ser visto apinhado com pedaços de madeira no ranger de manhã à noite tal os instrumentos do bom pai que terminou dizendo a missa, quando ele trouxe os prisioneiros. Foi em um canto de montanhas selvagens que uma rocha gigante onde um figo de vetores em sua haste estão curvados de um modo que formam uma espécie de altar coberto - como uma toalha - um estrago excelente. A localização é ótima para a construção de uma cidade, ele pensa. Houve noite clara para os bancos do rio, por quebrar algumas árvores no soco das florestas, a grande floresta virgem enraizada lá desde o nascimento do mundo . Nas ruas brancas de neve, no nevoeiro da confusão, o ruído dos carros e sinos, a multidão prensada, alegre, os restaurantes ao vento, as cabanas, as prateleiras. Lojas e flores, ramos de azevinho verde, os montes de carga se completam de pingentes usados em armas despersas, dominando toda a cabeça, como uma sombra da floresta da uma memória da natureza no manequim de inverno. O dia cai. Há peões e ciclistas por toda parte, que podem respirar no pulmão da cidade, de azuis e brancos diamantes nasais que provocam verdadeiras merênices em algumas pessoas, o que faz com que o segredo do seu afeto se dispense na onda da linha, o que explica a razão pela qual a fiel união do mistério com a comédia, aterrorizada e espantosa, se permite analisar os trejeitos sensuais daquele homem que é um pavão de roda, cujos olhos a imagem causa na noite o coaxar de um pântano pederastra, o público permanece considerando suas orelhas que faz até a dupla natureza da sua concepção colocar em uma único espírito no que se compromete a julgar com alguma profundidade as suas manias suscitadas. Um veredito no ridículo. Inevitável banalização. Realismo na pena de morte: o preâmbulo de uma forma muito alta de um edifício, em cujo nome uma lei sobre as execuções serve para incentivar as meditações, apesar da ligeira dissidência literária de perseverança dispensável.

terça-feira, 26 de maio de 2009

Cura pra dor

Ele desenhava em sua casa para vender na rua, desenhava nas ruas para não faltar em casa, nas pinturas que eram reconhecidas pelas avenidas de Porto Alegre, uma cidade tatuada das primeiras artes atuais, comprava calças para a família em Recife, siruismo da moda, vestimenta fundamental de sarlotas. Andava com segurança por entre as avenidas, passos moles de quem deve algo para alguém, de quem comprimenta com acanhamento, olha nos olhos com um sorriso patético, furibundo, se desconhece enquanto bebe, sabe de tudo de si em eloquência, se atropeça, se não ama direito, se não move um destino para outras memórias, é porque não se expressa com exatidão. Haviam gatos espalhados para ter o dinheiro de volta quando bem o quisesse, não recebia em notas abertas, não dava troca. Vivia de caricaturas no centro do teatro Pedro Parenti, na pracinha da frente. Seu dia preferido era o de quinta-feita por saber aonde iria depois do trabalho encontrando amigos disfarçados de verdadeiros, catrevólos e sorocabanos, movia as mãos ao urinar como quem se masturba, mas só passava a impressão. Sempre urinava nas calças ao voltar do banheiro, subia o shorts e descia a camisa para tampar as marcas de respingo, ás vezes a camiseta era curta e não dava conta e se não bastasse ainda voltava e bebia com indiferença. Desenhava em guardanapos e ofertava para as moças julgando estar causando boas impressões.Seu melhor amigo trabalhava numa banca, folheava os gibis com alvoroço, emprestava alguns com a condição de retornarem em perfeitas condições. Num desses dias de sol que os dois conversavam em frente á banca, o jornaleiro cobrava do desenhista porque ele não exercia sua profissão, que era a de engenheiro químico formado. O desenhista lembrava de um episódio da faculdade, que não justificaria, mas que exemplificava: "Lembro de um amigo de faculdade, o Roger. Tinha grande talento para a escrita, publicara desde jovem contos nos jornais locais, matriculara-se numa universidade federal para estudar as letras. Todos diziam que ele iria se formar com louvor, faria um doutorado, seria um dos maiores escritores brasileiros, se não, o maior da região sul. Decepcionou á todos, largou a graduação no terceiro ano, nem chegou afazer mestrado, foi cursar matemática. Pegou todas as suas teses, seu material da universidade e seus escritos, me convidou para irmos até a praça Carlos Simon Artz. Colocou todos aqueles papéis num baú, botou fogo nele e nós dois ficamos fazendo uma dança apache em volta." O jornaleiro comentou que achava que escrever era como cozinhar. Todos podiam escrever, todos podiam cozinhar e que os julgamentos nada mais eram do quê uma tentativa de hierarquizar a sociedade como ela mesma tenta desde o princípio. "Sabe, acho esse jornal do zero hora muito rabiscável. Adoro desenhar nele." "É seu", e deu o jornal ao amigo. Riram ao modo de madames entendiadas do século dezenove e combinaram sair depois das oito da noite. Um amigo farmacêutico que havia prometido uma mulher branca, fácil de esquentar e quando esquentada fazia loucuras. Um milhão, dois milhões, ele não se lembra exatamente quantos números. Quanto tomavam café ele batucava com uma colher no saleiro. O próprio farmacêutico aplicou a ampola. Decidiram sair um dia a noite á pé. O baque foi instantâneo. Achavam ter contraído uma pele de galinha depenada, Os sons de buzina se chocavam com a sensação, cacoalhavam a crista carnuda, a endotermia acelerada, perderam os dentes e as bexigas para reduzir o peso e alcançar vôo. O desenhista deu um pulo ridículo com esse propósito e bateu as mãos, o jornaleiro não riu, se concentrava na tentativa e nem se surpreenderia caso o camarada obtivesse êxito. Numa das avenidas mais movimentadas de Porto Alegre, a Borges de Medeiros, subiram o Viadulto Otávio Rocha, em forma de U, acreditando estarem imersos em gelatina. Queriam subir o Sulamérica a fim de ver a cidade de cima, tomar umas garrafas, mas foram barrados na porta devido ás suas pupilas. viram um porco correndo na rua e acharam ser alvo de alucinação, mas não o era. Um maldito porco tinha saído de não sei onde e estava correndo para não sei que lugar. Deu até no jornal outro dia sobre um leitãozinho atropelado. Ele gritava se o parceiro se sentia com sorte. Uma mesa de blackjack cairia bem, me acerte no meio do nariz. Me acerte você também. Impressionaram-se com a força da droga que transformara a pele primeiramente em pele de frango e depois em tábuas. Vocês beberam demais, disse o policial, no que ele respondeu: Você se parece com a chuva. O vigilante agarrou o jornaleiro e jogou-o na calçada. Ele lambia a lama do meio-fio. Mais uma passagem desenfrada, já estavam em outro bairro sem perceber. Ele queria pular daquele muro para cair na piscina da casa de dentro. Temia cachorros. Não se preocupe. estou olhando pra tu. Confiou no amigo. Deu um salto com a perna direita dobrada e as mãos em forma de V. Via-se seu reflexo sobre a luz interna da casa, um super-herói. Não chegou a ultrapassar o muro, caiu primeiro encima dele e depois se depositou no chão de dentro num baque seco, como se fosse um saco de feijão. O amigo olhou por cima do muro e viu o companheiro estirado, camisa rasgada, arranhões no braço, escoriações na testa. Ficou imóvel durante um bom tempo, parecendo estar morto. Nunca correram tanto, nem na época de entregas do jornaleiro, nem na época de garoto do caricaturista. Deitou no chão, ambos deitaram entravando personalidades de músculos. Sabe, apanhei hoje no terminal de ônibus. Levei dois pontos no supercílio direito e acabo de voltar do hospital. Vi um japonês de cabelo muito liso, fino e escuro azul brilhante, rosto pouco oleoso e simpatizei com ele. Tinha mais ou menos a minha idade e eu perguntei se ele tinha irmã. A Lúcia tem dois gatos. Mishi e Mishinho, odeia gente escrota com dinheiro, o quê é um pleonasmo para ela. Mora em Jaçanã, em São Paulo. Foi para o Rio Grande do Sul e pensou em mudar pra lá. Joga sinuca. Acorda tarde no final de semana, tem uma pinta perto do nariz, tem vinte e três anos e seu sobrenome é Yamamoto. No final da noite comeram uma porção de batatas fritas com refrigerante numa multinacional alimentícia. É nissei? Sim, a Mika tem grande tradição para desconhecidos. A mãe veio para cá com três anos, o pai com doze. Tem dois irmãos homens, mais velhos, seu quarto está passando por uma reforma, não entende gírias e é formada em história. Não sairemos mais em restaurantes no bairro Rio Branco. Nuvens é uma palavra que não gosto de ver nos jornais, destoa demais, o desenhista concordou sem dar acesso.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Um corredor até ela

De pensamentos guardava o corredor, tal uma druida equivocada. Tem um final cego, de quantas uma tornou-se o de ser encapuzado na páscoa. Com pescoços que haviam agora, espalhados pelo chão de zinco, punha nomes na claridade. As vestes do pai já eram em si uma filosofia umbelical. Atravessara sozinha na clandestinidade, tal pai, tal tia. Seu pressentimento fora sempre na hora de estar durante o motor. Corredor de seu nomes: "trajeto de" ou "infinda". Continuava, deveria, ousava, ousava a porta. Podia encontrar uma vertigem. Continuava á todos um final que deveria ser pobre a ninguém. Recordaria. O corredor. Foi durante muito tempo que o tinham empurrado. Fecharia o dono á muitas portas. Num adulto a lâmpada range mais de vinte vezes, um definhado sargento da aeronáutica me disse. Ele, homem delatado. Respondeu que ia varrer sua infância como podia. Vinham sozinhos e recitavam Descartes, incontáveis. Ela se tornou uma sequência dentro da meia, sabia que dormia ás vezes para a ceia, não podia permitir a ultrapassagem. Podia ter um filho. Tentava, ardia. O dono caminhava no aquário,de sua tia o último desabrigo. E com o armário já falado? tinha uma dor de ave-maria, de assepsia em claridade, dentro daquilo semi-morto. Fora comunicar bravamente se o coração tinha figuras e se algo possível jazia no porto. Quem chegar leva estas lágrimas de escuridão; escapou-me, quê o quer assegurar estrelas devidas, nem um resiste que sentimentos serão feitos por ceticismo convincente das costas, e se triste lhes são as coisas como figuras, que seja menos imatura, enquanto o imaginário semi-vivo permanece no cume dos rubros matos, montanhas invictas, não resiste um bocadinho enxergar que um bocadinho as coisas tem respostas dissimuladas e saem do tempo constantemente. Pedaços de deserto aparecem. Pedaços de água também. Dentro ali, as montanhas, as tangíveis de amante viram algo que arrancam bafos de demência dos gestos.

terça-feira, 19 de maio de 2009

Lepidotríquias (Peça curta para teatro)

Personagens:

Leopoldo Tavares – Homem de quase cinqüenta anos, calvo e de cavanhaque.

Benedita Tavares - Esposa de Leopoldo. Sempre vestida como um sofá de puteiro.

Amâncio Tavares - Filho de Leopoldo. Jovem de vinte e quatro anos. Patético, cara de tonto.

Januário - Sócio de Leopoldo. Corpulento e brincalhão. Agente Funerário e Juiz.



Primeira cena: Mesa de Jantar. Todos comem, Leopoldo levanta calmamente e vai até o aquário e o coloca no centro da mesa com certa força. Olha a mulher e filho, e diz, ainda de pé: Leopoldo – Aqui vou falar a verdade uma vez. Esse é o único ser que realmente amei em minha vida. Esse peixe. Digo de total sinceridade que eu ei de morrer antes dele. E os preparativos por mim ainda, digo, já começaram. Benedita – Senta Leopoldo. Termina seu bacalhau. Tá esfriando. Leopoldo – Não gosto de você – aponta para a mulher – e não gosto de você – aponta o filho, dessa vez com mais raiva. Benedita bate os talheres na mesa e se levanta. Leopoldo a pega pelo braço esquerdo.
Leopoldo – Ouça mulher. Eu tive um sonho anos atrás. Muitos anos atrás – se acalma e solta os braços dela, que fica observando no mesmo local – eu ainda era menino. Sonhei com o dia da minha morte. Sempre busquei... Sempre busquei um apego, uma paixão. Esperando realmente esse dia... Tudo em vão. Esse peixe é minha vida. Vocês são complementos dos quais nunca fiz questão. Amâncio não parara de comer durante toda a breve discussão, faz um gesto como quem termina o prato e diz: Amâncio – isso não me interessa. Benedita – A mim muito menos. Os dois saem da cena. Leopoldo fica sozinho. Senta calmamente na mesa e começa a beijar o aquário, abraçando-o depois. Tenta acompanhar o peixe em seu movimento como se buscasse atenção. Leopoldo - O que determina a duração da vida do peixe é a sua espécie. Existem peixes que duram muitos anos e existem alguns que não suportam aquários e morrem logo. Comprei você, hum, exatos cinco meses. Eu mesmo não duro dois. Fala meio resmungado, depois de um pequeno tempo: pH, dureza, temperatura, ligação, ósseos, cartilógenos, símbolo cristão, escama. Como é mesmo?Pelágicos, demersais, mesopelágicos... Nisso há um barulho de quem bate em
uma porta. Leopoldo apenas olha, não responde. Entra Januário, seu sócio. Januário – Fala Leopoldo! Leopoldo – Hum... (Meio desanimado) Januário – Ótimas notícias. Fechamos o negócio com o Macedinho. Temos que comemorar Leopoldo, comemorar! – com um sorriso dá um tapinha nas costas do amigo, que ainda permanece sentado e indiferente.


Segunda cena: Cortinas se abrem. O agente funerário encontra-se de pé, Benedita sentada na mesa, ele lê a íntegra do testamento: Juiz - “Eu, Leopoldo Tavares Companhia, brasileiro, vice-presidente de uma empresa particular, domiciliado e residente nesta cidade, na rua Joventino Tancredo nº 199, RG tal, CPF idem, natural da cidade de Ponta porã - MS, nascido em doze de janeiro de 1954, filho de Félix Tavares e Rosa Aneâncio Tavares, ambos já falecidos, casado, pelo regime fechado de bens, com Benedita Tavares, com quem tenho um. filho, estando em perfeito juízo e em pleno gozo de minhas faculdades intelectuais, na presença de (03) três testemunhas a seguir qualificadas: Meu sócio, Januário Lobres Pontes, meu contador Federico Ricco e meu tio Tancredo Tavares livres de qualquer induzimento ou coação, resolvo lavrar o presente testamento particular para dispor de meus bens para após a minha morte da seguinte forma: PRIMEIRO: não podendo dispor de todo o meu patrimônio por ter herdeiros necessários deixo para minha mulher, a totalidade da parte disponível de meu patrimônio existente por ocasião de minha morte, porém salvo condições apresentadas ao final deste; SEGUNDO: para meu testamenteiro, nomeio meu sócio, Januário, acima qualificado, fixando o prêmio de (10%) dez por cento, ao qual peço que cumpra e faça cumprir as presentes disposições de última vontade. Declaro não existir testamento anterior em qualquer de suas formas legais. Para que sejam liberadas as contas particulares e feitos os acordos que seja cumprida o meu último desejo em morte: ser cremado, colocado em uma caixa de tom azul escuro e servir de alimento gradualmente para meu peixe amarelo que acredito ainda estar vivo, e se não o estiver, que seja alimentada a sua possível prole ou parentesco comprovado.Nada mais tendo a lavrar, dou por encerrado o presente testamento na presença das (03) três testemunhas acima qualificadas, para as quais li a íntegra do que nele se contém. Local e data, etc.” Bem, é isso – retoma o Juiz,
abaixando o papel, precisamos cremar o corpo” Benedita – Como vamos cremar esse corpo com as contas bloqueadas? Juiz – Acredito que você deveria realizar o funeral ainda hoje e pensar em crema-lo depois. O peixe ainda está vivo? Benedita – Não.



Terceira cena: Cortinas se abrem. Leopoldo está sozinho no palco tomando um copo de água. Ouve a descarga e Amâncio aparece caminhando devagar. Por um minuto se fitam nos olhos. Ambos de pijama e descalçosLeopoldo – Os peixes não dormem. Eles apenas alternam estados de vigília e repouso. O período de repouso consiste num aparente estado de imobilidade, em que os peixes mantêm o equilíbrio por meio de movimentos bem lentos. Por causa disso trepo devagar com sua mãe.Amâncio- Ei pai, você se usa de exemplo o peixe pra transar com a mamãe ? Leopoldo- Éééé....... (visualizando a cena e disfarçando em seguida e mudando de assunto) ...outra história. E então filho o que você me diz desse olho de peixe que nasceu no meu pé?(mostra o pé esquerdo) Amâncio- Bonito! (diz, cortando e emenda:) Aquele dia o que você disse na mesa... é verdade?(Leopoldo olha para o filho com indiferença se vira e lhe dá um tapinha nas costas,próximo a saída do palco ,sem se virar,e diz:Leopoldo - Sua mãe me espera pelada.


Quarta Cena: Abrem-se as cortinas. O juiz enrola um cigarro de palha. Está sério e completamente suado. Seu olhar é fixo no horizonte. Enrola como quem faz isso há anos, automaticamente. Leopoldo está deitado na mesa, morto. O agente funerário mexe vez ou outra no cadáver, dando a impressão de estar preparando-o para o enterro. Acende o cigarro e joga a cinza na boca de Leopoldo, que está de boca aberta, faz isso enquanto abotoa seu paletó. Agente Funerário (Juiz) – É, Leopoldo... esse dente de ouro aqui vai pro saco. (diz enquanto abre as bochechas do morto). Entra Amâncio. O agente retira as mãos da boca do defunto na mesma hora. Amâncio – como está indo? Agente Funerário (Juiz) – Bem. Qual a causa da morte mesmo? Amâncio – Acho que se deu mais ou menos assim...



Quinta Cena: Abrem-se as cortinas. O aquário está no centro da mesa, Leopoldo bebe um drinque, joga um pouco no aquário. Ri e diz: Leopoldo- Bebe, neném, bebe. Vou pegar a primeira condução, acender o direito, sem medir as conseqüências, diante desse meu barracão, sem aperto pra te atravessar. Um minuto... (Leopoldo levanta e pergunta ao seu querido amigo peixe) Leopoldo - Oh!Estimado amigo é pouco uísque pra você,eu se pudesse nadaria em álcool,viveria embriagado,se não fosse a responsabilidade de cuidar de ti,nada me resta a não ser você.... (Ele para por um instante e o silêncio toma o palco. Leopoldo se dirige novamente ao centro do palco, busca o peixinho com as mãos no fundo do aquário toma-o e enche sua boca com uísque colocando o pobre peixe para nadar. Num primeiro momento suaves movimentos lhe acariciam a garganta, o torpor causado no peixe pelo álcool dá a Leopoldo uma sensação de que está fazendo bem ao se pequeno amigo, mas quando a ameaça de morte se tornou eminente o peixinho lutou para sair daquela situação engasgando Leopoldo que tossiu vindo a acordar
seu filho que quando chegou a sala não entendeu aquela cena, se aproximou do pai, ele já não respirava, Amâncio senta-se no chão ao lado do pai ,mas não consegue chorar,lembra da sala de jantar e das tantas outras vezes que fora desprezado pelo pai.) Amâncio - Caralho, o que a merda desse peixe estava fazendo ai?

Sexta Cena: Abrem-se as cortinas. Benedita despe Leopoldo. Abaixa suas calças até o joelho, põe as mãos embaixo da bunda do morto, retira um anel. Benedita: - era aí que você guardava esse anel, né Leopoldo? Antes de sair atrás de não sei quem, depois do almoço. Bom, a empresa é minha, as coisas são minhas. Morra feliz com esse maldito peixe e tenho até algo melhor para você. (Ela vai atrás do palco, pega um balde lotado de enguias numa água verde. Começa a colocá-las, todas, embaixo das nádegas do morto, algumas escorregam, outras ficam). Benedita - Pronto querido, aqui está seu troco (Ao terminar de colocar as enguias ela enxuga as mãos nos vestidos, passa as costas das mãos na boca, cospe). Senta na mesa, ao lado do morto. Acaricia seu peito por debaixo da blusa, deita sua cabeça em sua barriga enquanto acaricia.


Sétima Cena: As cortinas se abrem. Januário, Benedita e Amâncio estão jantando na mesa de centro do palco. Leopoldo chega com vários vinis e joga no meio da mesa, com força. Pula encima rapidamente, a mesa anda um pouco para o lado esquerdo com seu pulo e ele então começa a nadar de maneira lenta, mexer a bochecha como guelvas. Todos levantam rapidamente, desacreditados. A cada tentativa de tira-lo da mesa uma mordida. As cortinas vão fechando devagar enquanto essa cena vai ocorrendo. Ao fechar por completo anunciando o fim da peça, a mão de um dos atores abre a cortina por baixo e deposita o aquário com o peixe amarelo .

FIM.

sábado, 16 de maio de 2009

Velho acerto

A casa se destaca num pico de colina franqueado, parece feito por metade de um compasso partido ao meio, uma única janela disposta centralmente, em cruz, não há árvores ao redor, seu piso se estala diretamente no solo trincado, há barulho fino de vento na madeira, vista de longe não parece ter mais de dois quartos, uma cozinha, um varal que se estende até aonde não alcança vista. Ela tem maneiras poligonais e tem uma dimensão apenas. Falta menos de meia hora para amanhecer por totalidade, a coloração é de uma madrugada clara, cinza escura brilhante e opaca. Na janela, um clarão de lamparina no lado direito repercute em intervalos proporcionais. No porão, um recinto gigantesco, de centena de cadeiras, em uma delas do centro um gato velho de cartola e fraque pretos, encardidos, está sentado em sua sala de projeção. Assiste á filmes mudos e musicais. Parece emocionado, bebe uma mistura amarelada clara, fuma uma cigarrilha, funga o nariz. Guarda os rolos de filme numa estante alta, a escada é a maior espiral vista por aqueles lugares. De fora, um animal de quatro se arrasta carregando um tronco de árvore nas costas, amarrado por uma corda, demoradamente. O velho gato liga uma vitrola enferrujada na sala. Depois de raspar, a agulha se acomoda e o som da música é o tique-taque de um relógio, ele senta num grande sófa vermelho. Olha para baixo, afasta os pêlos da pata direita revelando dois orifícios. Liga um cabo de tomada neles. Seus ombros antes tensos, relaxam num largo movimento. Tira a cartola, olha pela janela á sua frente. O animal parece aproximar-se cada vez mais um pouco, sem pressa.

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Gonorréias Mentais

Um humor pedagógico-sexual do amanhã antes de anteontem só se contretizaram nesse momento, o ator fedorento e frenético rabisca palavras com gasolina limitada, intimamente infecciosa, navegando nu por espaços da ópera de raro queijo, releve a repulsa que repousa neste reles resto. Admiro-lhe a frase, bate uma sozinho, ostentosa manobra.
Dançava no barro fecal opuscular, de jardas quebrantes. Careca, puto e kamikase. Enterrava os micróbios destemidos. Xaropes variados intimos ao cu.

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Encontro

Sete idosas portuguesas se encontram numa esquina morta para trocar experiências sobre a temperatura. A primeira, Íovala, peadora e pecadora, tabacófila de primeira, olhos rubros, cabelos idem, cearense em gestual; A segunda, Iolanda, hábil no sabão-vegetal, cheirando tabasco, ebriativa e morena eclesiástica; A terceira, Iovele, obaluaê de convivências, obã de abacates, roupa cor de mel, obcecada em comprimidos obcodiformes, de certa obesidade; A quarta, Inací, obimbricada, de obituário recente, nabokoviana, de vacilância no olhar; A quinta, Ioda, de lábia baqueada, pacabote em labirinto, quadradice maternal; A sexta, Iobala, mestre na cabala, de ecidospório acadêmico, echadiça em fabagela fabricável, uviforme; A sétima,I oana, esquelética como ebanismo mórbido, cabelos cobreados, habilitante feita, amiga das letras, iacrana.
Iovele, Iovala, Ioda, Inací, Iolanda, Iobala e Ioana. Ioana conhecia Iovele que conhecia Ioda e Inací que conheciam Iovala que conhecia Iolanda e Iobala que conheciam um velho mineiro magrelo de óculos tarado.
Todas estavam a par da situação gabada, da mabounga existente, do pacaguaras vacaril. Esqueceram o chá com bolachas, servia mabaço, sorviam o bagaço, rebatiam a mamona. Que faremos adiante? Iovala, que estanciava o registro de combinação dos vocábulos, Sapos difusos em anitrópicas texturas, rendiam mais do que um balanço entre comadres, múltiplos exemplos: aberturas de dimensões da cerne da carne, criação compilada de retorno aos erros. A calda do preparado de Inací parecia mais jacamar, de papacidade boa, de sabaísmo idem. O sabão-de-macaco, ofertado por Iolanda, vacinava as pelugens sem cor das senhoras como um pacu de respeito. Fabulística Facada. Nas façanhas deste dia, destacaremos a de Ioana, que propôs idéia rabaz: reincidir o sabastro. No tempo apropriado a corrida de senhoras daria largada, uma a frente, outra perguntando o segundo ideal. Alvoroço senil. A primeira a chegar desconhece o próprio nome interessada em situar o recinto em presença.

terça-feira, 12 de maio de 2009

Epílogo

Carregava um espesso mantra nos braços, os ombros figuravam travados com o corpo, porém davam liberdade para as mãos, o olhar abismado e infantil, olhar de loucos embriagados de razão, os passos firmavam-se na terra como pregos em madeira mole, trazia a alegria dos profetas, a vontade dos justos e a afirmação convicta dos poetas.
Vinha cansado de batalhas, sereno, livre, cantava com a língua próxima aos dentes laterais, movia a mão que não segurava o cajado sintonizado com o rítmo das pernas numa proporção ímpar, porém bem cautelosa, e trazia na mente nada mais que o trajeto.
O andarilho era a felicidade.
Suas vestes não eram encardidas, mas eram dotadas de tempos e percebia-se que se lavavam em todo e qualquer dos riachos possíveis, seus fiéis amantes, ele tocava harpa com a barba, sorria pras crianças e ia caminhando, e ia caminhando, de tal anos tão antigos quanto sua figura no mundo, por ser passada de homem a homem aquela entidade.

Encerrando o Assunto

da forma mais ridícula possível. Dez horas quentes de viagem, sobrepostas a pequenos pingos de suor escorrendo como líquidos de seringa mal colada nas veias, ao mesmo modo que sacos de soro transpiram. O lugar do banco era o preferido do sol, o esquerdo, o direito, uma mulher cheirando á manga podre ao seu lado. Dez horas. Sem malas, apenas um case de tacos de golfe. Uma cara de raiva ressaquida, de fruta mal chupada, de quem estava num batalha de guerra e todos morreram, o mensageiro teve as tripas cortadas á sangue frio com uma navalha curta, e o batalhão inimigo avança sem pressa e consciente, enquanto ele olha apenas os dois companheiros que sobraram gritando e atirando ante os olhares de escárnio dos adversários, atira para morrer mais devagar. Apenas uma parada. Ele desce, acende um cigarro, dá baforadas generosas que fazem um idoso fumando um palheiro engasgar, esquece que está tragando e tenta acender outro, queima a cara consideravelmente com o primeiro cigarro, a reação sobre a queimação é demorada. Joga o primeiro cigarro quase inteiro no chão, apagado devido ao contato com a carne e fica com o segundo nas mãos trêmulas. Dez minutos, tempo de fumar seis cigarros e acender um último só pelo prazer de jogá-lo inteiro antes de pisar no primeiro degrau de entrada do ônibus. Agora são três horas somente, pensa. Sente a barriga arder cada vez mais a cada minuto, a cada quilômetro. Sua garganta solta arrotos azedos que ardem o céu da boca. As árvores passam demorativas, inconsciênticas (inconscientes e idênticas), sete maneiras de dizer oitenta, noventa, trocar os números por ter os ponteiros preguiçosos como batatas em palito fritando em óleo frio. Uma caixa gelada comete o erro de ter sombras de lua morna num dia tão quente, e ela tem sons que mentem a maior parte do tempo seu incrível preço, sua pequena irmã querendo ir pra onde, qualquer lugar que coloque pregos macios em sua cabeça, palhaços de membros eretos jogam-na no chão imundo de terra batida. Não consegue ver tão longe seu medo, agora ele anda ao redor das diversões e todos os sabores vazam pelos buracos do topo da cabeça, misto de dor, orgasmo e ódio, típico dos assassinos nascidos feitos, que sorvem a morte como alguém com os dentes a morder os lábios, cabeça curvada para trás, olhos fechados e arrepios na espinha, tal um adicto que se encontrava internado e fugiu atrás de sua verdadeira razão. Fazendas que criam nomes para depois abatê-los sem piedade para próprio consumo. Ele vê suas bolas penduradas na parede por um único prego, com único fio de sangue que escorre formando um J devido ao vento que faz naquela região. Atualmente tem pensado muito em bagos, ovos, olhos e objetos ovais.
Chega até a rodoviária e mal a reconhece. Salta do ônibus esbarrando, há quarteirões para andar. A visita é surpresa. A queimadura do cigarro na maçã esquerda do rosto começa a se tornar uma bolha mal cheirosa, vermelha nas bordas, amarela por dentro, transparente por fora. Anda rápido, descompassado, o begue de tacos sacoleja em suas costas, o surra como um chicote. Reconhece a casa. Como poderia esquecer? Faz menos de dois meses. Bate palmas, a pessoa que abre a porta mal acredita, quer entrar de novo, mas a curiosidade ainda é um dos maiores sabores do mundo e mesmo que quisesse não há portão, apenas uma porta que vai direto até a rua. A imagem que ela vê assemelha-se a de um dos perdidos em andanças no mundo: fedendo, mal vestido, triste, cabisbaixo, e com sombras de vida que teve um dia. Ele retira do bague de tacos de golfe uma Katana-Kaji, do Geindato, de forja tsukemune, cintilante aos olhos, generosa ao sol transformado em fino cabelo em seu espelho, comprada na economia de meses, afiada pelo Tomizo Ishida, a maior autoridade em espadas japonesas no Brasil, capaz de cortar um mosquito no ar de forma tão precisa que as duas partes do inseto continuam a voar acreditando estarem vivas. Sabe que é tão ridícula a idéia que o fez questão. Ajoelha tão rápido e com tanta força que machuca os joelhos, cerra os lábios segurando a dor, tudo no maior gesto pomposo como um bushi do shogunato. Põe a espada em repouso nas duas mãos abertas, abaixa a cabeça. Pronuncia: "Daijobu! Soba ni iru kara! Awatishua anataô uashitmasu! Palavras que me ensinastes dentre tantas e das quais nunca fiz realmente questão, somente a questão de vê-la sorrir ao falá-las. Vim para você terminar o quê você começou. Se não for por amor, que seja por piedade." Vendo a recusa da mulher de não tomar a espada nas mãos, e nada pronunciar, encostou-a na garganta. Bastava um mísero tapa de uma criança para enfincá-la até a metade no pescoço. Nisso aparece um japinha velho, muito gente boa, cabelos grisalhos, falar arrastado, magro, interessado nas economias, nos jornais e reconhece o cara, sorri, estava entrando em casa. "O quê está acontecendo aqui?" O samurai ajoelhado e rídiculo responde: "Coisa de jovem." O senhor Yashuhiko Murakami, conhecido como Seu kiko, tão gente fina que arrepia, retrucou "Que ótimo. Sinto saudades dessas brincadeiras, aproveitem ao máximo enquanto podem." Enquanto o sujeito pressionava a katana nervosa no pescoço o velho sorriu de um jeito cordial e entrou, para tirar a camisa, tomar uma cervejinha e assistir ao jornal. O silêncio da ex-concubina pouco ponderou: "Como você é bobo." Ele retrucou: "Termina logo com essa porra, acaba de uma vez. Como se pode confiar em alguém que sangra todos os dias e não morre? Já estou morto há meses, acaba com essa carcaça fédida e essas idéias imbecis e cheias de clichês das quais você transformou minha cabeça." "Vou entrar, fechar a porta. Vá embora daqui, seu louco" Ele a pegou pelo braço. "Eu imploro". E começou a chorar de um jeito tão medíocre, babaca e assustador do qual o mundo não havia parte. "Suas palavras não me tocam mais, conheço cada artimanha delas, uma a uma" Ele respondeu: " O quê se acha em obstáculos intrapassáveis que insistimos em sobrepor e nos ferimos ainda mais? Considere isso ao menos" Ela: "Você só teve sofrimento comigo, por que insiste em sofrer ainda mais?" "Tive sofrimento, prazeres, enjôos, decepções, descobertas, tudo e mais as diferentes combinações que essas coisas podiam me oferecer. Não consigo afastá-las tal um doente, ando doente dentro do apego sobre mim mesmo." Ela entrou e fechou a porta com raiva. Ele ficou olhando para o trinco, com um risco de sangue no pescoço e uma espada cara nas mãos. Andou arrastando a ponta da espada no chão, gerando sons vivos, focados na raspância que ele também sentia na garganta. Ambas simbióticas. "Que diálogo mais bobo", pensou. Encontrou no caminho um bando de pirralhos, uns sem camisa, outros de camisa larga, média de sete a dez anos, brincando na calçada, sujos e ranhentos. Deu a espada para um deles."Brigadão Tio!" gritou um, desacreditado com tamanha generosidade. Enquanto se afastava podia ouvir a excitação da molecada.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Sala

As conotações negativas aumentam os olhos para o instrumento pontiagudo que fica estático na mesa. Suas teclas são feitas de marfim puro, o obeso de manchas negras na perna afirmou em tom de sarcasmo. Uma máquina de escrever lhe toca as narinas. Abra os olhos, feche os livros. Poderia falar sobre você, escrever somente sobre você o restante de minha vida, mas toda vez que me remeto a transfigurar quadros cotidianos em letras, um rasgo agudo passa acelerado no peito. A sensação de confinamento e confiança sobre si próprio foge quando a experiência não é o resultado de uma disponibilidade e de uma disposição própria do sujeito sensível. Diante da cachoeira, sabe dos reflexos prováveis do terror. Nem lembrar eu quero de cenas banhadas de alegria, nem dos segundos mais fixos que um dia. Elas já me atormentam o suficiente ao longo que vivo. Não se vê, se não se vê por si mesmo. De posse do formulário, você me disse uma vez que me resumiria numa palavra: saudosismo. Voce foi mais do que meu momento, mais do que meu cigarro abatido, meu músculo flácido. A Função de um despertar que se endereçava a uma dimensão da nossa sensibilidade em vias de entrar no grande sono da reprodutividade mecânica. Uma coincidência cronológica que rompe a atenção não induzida. A atenção é um despertar, dentre os vários despertares tardios de uma vida.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Estudo de personagem

Vamos tomar uma viagem juntos, até o longo da irresistível escória de um vermelho pastoso para coisas frias no espaço negro de imagens de vidro. Vamos ver o balanço tabagista e passageiro ao procurar um e outro entre um justo e sozinho pedaço de metal diáfano e um claro trem transparente de questões exatas que desce nervoso até nossas veias alvas, ausentes de diagnósticos. Não fique nervoso quando descermos, não mais viajará depois, essa estrada fecha. Sempre fecha. Ele era um menino ávido, animalzinho cheio de desejo, e Fulana divertiu ensinando-lhe as perversões de que era sábia. Mas cansou-se rápido, pois ele não tinha nada para lhe dar e fora da posse furiosa, ficava sem nada dizer. Ela encostava o corpo nu na janela cansada daquilo, o cenário era um coro ressoando em sua pele velha. Quando sai do delírio sexual, o homem não mais a interessa. No fundo só tem a posse para prender seu coração, o que não basta. Deitada na cama, ela fez planos como fez com todos os outros. Pega o caderno, rabisca: “Eu ouço uma voz no fundo do quarto chorando, é algo bom. Vamos pequeno eco, deixe-me ver sua face. Vamos, pequeno eco, eu sei que você tem algo a dizer. Na falta, um cão frenético, inebriado com essa grotesca chamativa, me diz que tudo aquilo foi e é um dia muito bom, e eu querendo te introduzir aquela poção especial, sua veia escapando. Está oriundo de mim? Não, está vindo até mim, agora eu sei o que realmente preserva-se lacônico ao dia, eu conheço algumas pessoas que podem dar o seu troco.” Engoliu o licor de cacau. Ela tem graves maneiras de escapar pelas mãos, ela tem um sorrir de vocábulos, de trilha arrematada, de estar tudo errado. Com o presente amante, na cama perdera os trejeitos de antes, ás vezes era como uma mula submissa aos guris da roça, ás vezes era como um papagaio que sacudia as asas, se arrepiava, abria as penas do rabo num grande leque verde. O céu se derrama em estrelas como o sangue rola nas coxas de uma adolescente virando mulher, a noite é morna, o desejo sobe da areia em forma de calor, e ao terminar com seu homem, lembra da infância e de seu namorado da época, Ernesto. Fora criada na roça. A sombra das roças é macia e doce, é como uma carícia, os dois se fecham em folhas grandes que o sol amarelece. Os galhos se procuram e se abraçam no ar. Naquele jogo quase de criança, tão requintado no vício do amor que era quase puro, eles passaram a hora triste do crepúsculo. Adormece nesses pensamentos. Sonha com o dia em que Ernesto trouxe orquídeas para que se despisse. Orquídeas rubras e brancas, violetas e manchadas, todas as que antes brotavam dos cactos bravios no jardim, caídas sobre o corpo esplêndido de mulher.

domingo, 3 de maio de 2009

Dia 23

Queria pedir licença para o tom desabafante, sons que eu nunca ouvi antes vem lá de fora, espero achar uma forma de dizer isso menos idiotamente. Meu nome é Tancredo Dias e há dias procuro saber do paradeiro e crise de Ângela, aquela mucama desgraçada, que encontrei numa festa pela primitiva vez. Estávamos saindo do apartamento de Priscila, cheguei com Mariana, aquela fragrância conhecida de noite fecunda e eu com uma lata quente nas mãos esperando no carro, pelo interfone chamamos-nos para dentro, íamos a uma festa e ela precisava pegar as direções com alguém. Quando subi, ela estava na cozinha aprontando uns drinques, ela usava um shaker, batia elucidada, mas isso não importa, ela me disse. Havia mais uma amiga dela na casa, qual não me lembro o nome, e eu começava a ficar seriamente embriagado ás sete da noite. Precisava trocar a bateria, próximo da morte, trocamos as idéias difusas, aquele cigarro enrolado me fez ficar num silêncio maior, olhos separados. Quando chegamos ao local de fadário, haviam mais pessoas procurando pelo número da casa. Ouvimos Morphine no talo a excursão inteira á quatro em meios á gritinhos de Mariana. Um copo plástico para cada daquela mistura verde-limão horrorosa que carcomia o vão dos dentes. Um bate-estaca de caixa-clara começa a tentear nas veias de meu cérebro naquele momento. O som do carro estava alto e eu tinha passado toda a manhã daquele dia viajando, o dia bebendo esperando. Voltando ao local de embate, a sala tinha um chão de azulejos de banheiro, do qual o meu sapato grudava vez ou outra, fazendo-me quase tropeçar atropelando. Um bom tiro cai bem. Não, grato. Hoje vou de líquidos diversos. Não havia mais de quinze pessoas na sala, quatro na cozinha, um som alto de rock coreano me remetia á baladas da vila mariana. Dispensava. Fiquei perambulando pelos cantos, aquele aroma de vozes molengas, balsamadas, aquela luz azul que tanto irrita em bares que cobram mais de vinte reais a entrada, porém aquilo era um apartamento. Pernas trançadas, bocas semi-aberta, olhos orientalizados, em forma de V de ponta cabeça, formando um triangulo com meu queixo, meu olhar em câmera lenta para o maior movimento possível do exterior, arrastava a ponta do tênis como enchido de um diplomata gordo, rico e quieto. Julgava. Estava bem, no difícil liminar entre o sagaz e o bobo, preservava meu silêncio de quatro horas atrás. Consegui perder minhas amigas num âmbito menor do quê trinta metros quadrados, talvez estivessem em minha frente, talvez não, talvez tivessem ido embora. Sorvi cada gota da cerveja que parecia estar vazando pelas minhas narinas tanto me sentia preenchido de líquidos destilados e fermentados, tanto tivesse como tanto. Sentei no sofá, uma nutrida fêmea cheirando lavanda puxou papo comigo. Bem nutrida, eu diria. Virei o rosto lentamente e comecei a fitá-la, ela achou que eu prestava atenção. Só via sua boca subir, descer, rebolar, endiabrar movimentos enquanto minha visão parecia martirizada, pois podia ver as minúsculas gotículas de saliva saltando em câmera lenta de sua boca. Algumas pessoas dançavam em nossa frente, pude ver de rabo de olho. Minha mente esguarniçava um regurgito estomacal em breve. Encontrei-me em seu ombro. Chamava-se Letícia, soube mais tarde, e ia falar que eu precisava ir ao banheiro, mas na ânsia de idéias decidi fazer um voto de silêncio já que não falava á quase quatro horas. Dei três batidinhas em seu ombro e levantei num impulso tão forte e ansioso que cai pra frente e segurei em suas coxas que tinham a largura de minha cintura. Ela sorriu de canto. Dei risada e quase falei, saí vazado. O caminho do banheiro eu já conhecia de cor. Ele já exalava o cheiro do meu saco. Incrível o fato que na época eu transava mais de quatro vezes por dia, já fazia meses. Quando se transa tanto se chama mais a atenção, exala-se um olor dos bagos que me eu próprio sentia tesão ao senti-lo, não sei explicar direito, mas tive uma namorada que era bióloga e tinha sempre essa explanação de base hormonal em argumento irrefutável. Fato é que fui abordado no caminho do sanitário, não por uma mina, mas por um cara. Posso te chupar? Voto de silêncio? Passei na frente dele olhando pro chão, mortalhadamente, como um espantalho vivo e pálido e entrei no banheiro. Tranquei-me por quase meia hora, nem ouvi as batidas na porta que devem ter sido muitas, mas a verdade é que gorfei maior parte do tempo, a outra metade permanecida foi por medo. Dispenso barba no prepúcio, Monsenheur. Muito agradecido, mas vou pegar outra breja. Não podia falar, saí com medo de topar com a figura ainda, mas ela não estava lá, vi no canto direito da sala principal, atentei em não fazer contato visual. Minha trepada era a bebida. Vi Ângela pela primeira vez na festa depois de chegar com ela, a quantidade de pessoas havia triplicado, veio fazendo perguntas. Ofereci cerveja no intuito de calá-la. O circo estava se tornando mais interessante. Fiz um negócio que idolatro quando estou bebido, mas que não deve ser repetido tanto por ser meio arriscado: encostar num canto panorâmico, sozinho e com a intenção de permanecer nessa condição, analisando horrores, querendo pescá-los em simetria, divertir-se com a bobagem inevitável de si próprio. Quase dormi encintado na parede quando vi algo notável, gostaria que Machadão estivesse no meu lugar. Nem idéia de sua reação. Nunca vi ninguém esquentar nada na colher antes, somente em películas. Aproximei. Acabei caindo de cara no chão. Era verão, pessoas vinham e me diziam de botões, sem faliculismo, fui levantado por duas pessoas e resolvi deitar no sofá. Começava a delirar. Não querendo quebrar meu voto nem ficar quieto gritei um "iuhhú" ridiculamente. Ainda era uma da manhã. Acordei lá pelas duas e meia com muita sede, me dirigindo diretamente ao freezer, estava menos bêbado, porém mais tonto, precisava dirigir ainda, porquê Priscila não tinha mais condições para responder por Ãngela e sua amiga devia estar no quinto tempo com um carinha que devia usar pó-de-arroz. Nunca vi alguém tão isento de barba; nem os engenheiros da universidade, nem médicos recém-formados. Já não havia mais motivo de voto e disse então que precisava dormir mais, ela riu olhando para baixo. Havia urinado nas calças. Hora de mudar de águas para nadar em sossego. Fumar me faria pior, recorri á imagem antes de apagar. Nunca havia experimentado e por tanto canto procurei como um recém-acordado submerso em meleca uterina. Queria descer á cidade, lembrar de piadas reais que não inventadas, um jardim com tomates gordos com feijões e vinho. Eu conheço um jeito de nadar até a cidade, juro. Ninguém quis entrar em águas comigo e decidi ir sozinho;

sábado, 2 de maio de 2009

Cozinha

Quantos sóis absortos, de diferentes identidades, preferentes quando chegavam a surrar nossa única janela de casa, regada com uma flor que me dera e dissera ser a caricatura única de nossa ternura. Quantas vezes desfiei-a murchar, jorrando água ás pressas tais regentes, para que decretasse que iria embora, trancafiando-me no quarto em noite de acesso. No abismo de sua racha tchalaguei todos os dedos. Decretaste ás goelas acessas dos confinantes todo seu estupor de quem jazia estropiada na cama, ficando fula puta depois, mas concedendo no meio. E que o silêncio, um dos nomes de Deus, se aconchegava aos poucos e caiava sereno no quarto, ditando ordens de saudosismo, você num canto da sala, eu em outro e o criador e criado do gemido tardio no meio. A solução era o soluço. Atualmente percebo que minha massa cerebral é chula como um frio sanduíche de merda, virado com o recheio para baixo e encostado no canto de única mesa que tínhamos e que hoje já não sei mais. As diferentes dobraduras de vivências, ambas colidindo em nossos gestos ao cozinhar, banhar, andar, sair, beber, fumar, amar já me foge de tantas, chuvas verdes que você observava quieta debruçada sobre a janela, a laje aliciava cantos compassados, e os montes estaticamente frios cobriam minha nuca branca. O tempo sempre foi nosso amigo, mas constantemente exigia provas de amizade para com ele. Nunca ponderastes ditados falecidos com gosto de creme em maçãs fálicas, nunca disse que o repouso nada mais é se não um tempo nada maligno dado a ele mesmo como amostra de seu talento próprio rejeitando seu próprio ser requisitado dentro de sua vontade necessária. Hoje, quanto mais dentro da noite, mais noite dentro de mim. E nem dizer quanto sinto sua falta me julgo capaz. textos confissionais, inatíngiveis respostas, alentos repetitivos. Não há nada de novo, a velha história de dar corda no planeta. Atravanque quem sabe um dia, e que tantos dias bonitos vivi pelo fato simples de serem apenas bonitos, tardes fechadas, desconhecidos cerrando os lábios em tom de deboche, um medíocre segundo dado para si mesmo. Quem me dera ter a eloquência do mudo, os olhos do mundo, o livro que lês. Sou apenas mais um repouso traduzido em recreio da vida. Um nada. Um ser errante, com o álibe e perdão do termo á romantismo clássico. Uma nuvem chega de muito longe, pessoas também, e do mesmo jeito que chegam nos vão e não há nada que possamos fazer sobre isso. Alarmada, gentil e senil vida senhora, compromisso de saberes, maravilhados espantos delirantes, por trás de nossas ridículas faixas faciais escondemos nosso próprio enigma, luares que entram em nossa sala sem pedir licença. Me refiro á você e seu desejo que compactuo de construir a desconstrução a cada espelho tranparente de cada dia. Tranfiguro meus testículos em ovários violados sem medo de parecer cômico, pois no príncipio eu era a sociedade, raspando dignidades, distribuindo obséquios, coçando os bagos sem anseios maiores. Agora me sinto á vontade para lançar o mais puro jato de vômito literário, direto da fonte, sem pompas, sem modismos, sem filtros encadeados vindos da massa craniana exalando borras fecais. Gratificantes as rosas de sal mesmo não tendo olhos, dando as mãos enquanto o mundo respira como em uma tela de zinco, porém sem invocar a frescura da superfície que possuem as palavras isoladas. Entendo sua aflição e cansaço, calma provacativa de não ser implacável sem retoques incriminados, a inutilidade é uma questão de casos característicos, de dormência das vontades. Ando meio emotivo, abestalhado, impulsivo mais do quê já sou e não sei mais da minha própria veracidade. Tenho sido fodido por quase tudo que cruza minha frente e a impressão que tenho é que uma velha de ceroulas amareladas da mais pura urina (aquela que parece ouro líquido), unhas abarrotadas de carniça dos dentes, sorriso e falar diabólico costura minhas linhas da vida na epiderme de um felino doméstico morto á meses.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

História

Debruçado no papel, digo, no computador, uma chuva de chicotear costas de diabos, o latido de um cachorro de médio porte busca minha orelha á quilometros enquanto pensava se escrevia ou não.
Um movimento do tempo pousou na minha mesa que raspara a memória tão fina e em tom mais presente.
Uma porta bate. Um homem grita. Um carro passa. Os ciganos tomam conta do ambiente de uma seca fruta em casca desaguando num sabiá que eu nunca vi. Que bobagem os sabiás serem todos iguais, porém esse meu espaço se concentra virando cigarros já fumados, molhados num riacho, o Riacho Fúnebre dos Dezoito do Forte, lei dos sexagenários, a destruição do Paraguay e que ainda não prometo cadáveres nessa narrativa, e tem ainda, ainda, mas ainda mais, ainda o Senador Vergueiro, esse bode masturbatário, em Cerro Cora estão em minha frente, mortos, que até fariam Alonso Pena uma bailarina comparado a isso.

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Novo Mundo

Era uma vez uma nação de homens de barba cujo líder possuia uma atração incomum por loções. Dentre os comandantes das forças armadas apenas um sabia ler, porém todos os soldados rasos também o sabiam. O ministro das Relações Exteriores era a única pessoa dentre a população masculina daquele modesto país que se barbeava (não por vontade própria, mas por exigência do cargo). Eram os únicos que podiam mostrar a todo continente que podiam viver totalmente barbados mesmo num calor infernal que é o dos trópicos, tal como fazem nos países mais frios da europa, ou faziam. Os outros povos do continente não achavam aquilo de boa estética comportamental e tratavam de por caras limpas em rostos tomados por pêlos.
A cada barbado morto ou ferido, dois caras limpas deixavam a barba crescer.