terça-feira, 7 de fevereiro de 2006

De todos os trajetos prostitutos só areia guardei em meus sapatos

Mais uma vez aqui sentado tentando colocar palavras em lugares errados, mas ouvi uma vez que a prosa é uma página em branco sobre a qual podemos cagar. Pensamentos como estes me levam até Mirela. Mirela sim, era boa de chupeta. Lembro-me que em 76, ou melhor, 77, ou inicio de 77, não sei ao certo, fazia viagens constantes ao Paraguai com dois amigos da empresa. Ali havia os presentes ideais, sem revenda, tudo para consumo do pessoal. Aqueles tempos, sem preocupação de camisinha, sem muita fronteira, bigode á vontade. Hoje sou aposentado. Jogo Tênis com um ex-companheiro de firma e digo que amo minha mulher. Minha Mulher, Agenélia. Como era bela, agora é uma gorda que bebe o dia inteiro. A gorda vive com raiva na sala e grita com meu filho de dezoito anos. Em verdade, eu tenho vergonha. Vergonha de ter nascido um idiota por completo. Ter vivido um idiota por completo. Ter feito boas ações, ter tentado fazer as coisas certas, ter saído com poucas putas. Hoje escrevo nas horas vagas. Quando não paro para coçar o saco até criar feridas feias.
Podia citar quinze nomes, mas dariam muito trabalho. Muito trabalho. Idiotices, mediocridades e perdições. No meio disso tudo, música! Como se um teatro se abrisse e uma ligação feminina se resumisse em dizer que não me acha no endereço especificado, sabe, uma espécie de liga. Imaginária, claro. Voltemos a Mirela, a boa. O grito que ele dava no quarto, quando era fim de semana na praia, quando era dia suficiente, chamava a atenção dos chalés ao lado. Na cidade de encontro, do dia branco, comprávamos sapatos para podermos jogar ao mar com nossas preces. Era esta década de setenta em que a repressão não se mostrava, mas existia em excesso. Jovens falam dela em excesso e não ouvem seus pais que viveram nessa época. Mirela dizem estar trabalhando de vendedora em uma loja, nunca mais a vi, não quero ver. Mais deve ter casado? Lembra de mim? Quantas perguntas estúpidas...
Bom, continuando. Estávamos em 77, ou próximo disso... Alugávamos uma casa no litoral para nos encontrarmos. Eu da Vila Mariana, ela de Perdizes, tudo em seu respectivo lugar. Dizia que ia passar o fim de semana com uma amiga na praia. Ás vezes ela atendia o telefone e eu estava agachado com a cara em suas carnes enquanto a safada falava com os pais. Bons tempos. Hoje tenho cirrose. Hoje minha mulher me xinga. Mas em 77..bom, acho que foi em 77...Você acha? Reclamar do arroz que eu fiz? Aquela gorda senta com sua bunda gorda, me olha com a cara gorda, me xinga com a boca gorda e ainda reclama do arroz que eu fiz... Mas Mirela, bem, voltemos a Mirela...
Bom, continuando... Mirela tinha os cabelos loiros cacheados e era muito magra. Podia levantá-la pela cintura e carregar até o mar enquanto batia suas frágeis e macias mãos em meus ombros. Seu sorriso era franco e às vezes infantil até por demais. Olhava primeiro nos meus olhos, depois descia o olhar até a virilha (onde a mão cuidadosamente já havia se apossado) e voltava o olhar para mim, naquele calor..naquela época...naquele vento... Peraí, minha mulher me chamou pra dar comida pro Frog. Ha. O Frog é nosso cachorro de estimação. Ele é cego de um olho e não anda direito. Ele é meio velhinho, sabe?
Voltei. Continuando... Fazíamos janta sempre nesses dias. Almoço não dava tempo, acordávamos muito tarde e passávamos a foder até umas cinco da tarde quando nos banhávamos. As jantas eram sempre coisas rápidas, feitas sem pressa, mas rápidas. A noite era a melhor parte, passear naquela cidadezinha, ir pro motel “Sereia Serena” (Um muquifo, onde nos intervalos da transa era necessário acertar as baratas com o chinelo). Tudo era muito belo. Tudo era muito lindo. Morava com os tios e o carro era sempre liberado. Já tinha trinta e poucos anos, Mirela dezessete, mas era como se eu tivesse vinte. Anos deliciosos. Ontem consertei o telhado. Agenélia ficou embaixo dando palpites. A vontade era de tacar uma calha na cabeça da maldita, mas ouvi, como sempre.
Bom, vou parando por aqui. Tenho que fazer janta pra minha mulher e filho. Sabe como é, escritor de horas vagas, escrevo sempre que termino a faxina da sala, é um costume...